- 25 Agosto 2014
“ Os avós do século XXI aparecem com uma imagem ativa, com vida própria, capaz de fazer uma leitura positiva de seu mundo pessoal, independente porque participativa; saudável porque adequada às suas reais possibilidades. O papel do avô/avó começa a ser descoberto por seus protagonistas atuais com as características modernas de quem resiste aceitar o estereótipo de velho assexuado, passivo, sem interesses pessoais” ( MORAGAS, 1997).
Introdução
No mundo todo, o envelhecimento da população tem sido um fenômeno de significativa importância, pois, à proporção que as sociedades tornam-se mais velhas, seus problemas de saúde agravam-se, desafiando tanto os sistemas de saúde quanto à seguridade social (DATASUS,2009).
Com o aumento da expectativa de vida, várias gerações vivem, simultaneamente, no mesmo espaço, com isso torna-se necessário mudar o conceito que a sociedade tem sobre o velho, uma vez que muitas pessoas pensam ser a velhice uma fase de perdas e declínios, tendo uma imagem negativa sobre essa fase da vida.
Se as gerações são continuamente construídas, desconstruídas e reconstruídas, a relação entre elas também está sendo refeita. Novas relações, por sua vez, determinam novos comportamentos das gerações num movimento dialético de retroalimentação permanente (MARQUES; DIAS; COSTA, 2010). Fica-se então instigado a saber o que ocorre na relação entre gerações. Conflito, competição, afetividade, indiferença, autoritarismo, igualitarismo? Afinal como se relacionam os diversos grupos etários?
A velhice como representação social
As relações interpessoais entre indivíduos jovens e os de idade avançada têm variadas implicações psicodinâmicas (D’ANDREA ,1986). Alguns jovens consideram que os velhos não podem mais ter lugar na sociedade, negam as contribuições que eles têm dado e o cabedal de experiências que adquiriram e com o qual podem ainda contribuir para o progresso. Esta negação leva ao temor que esses jovens têm de se identificarem com os mais idosos. Esta distância afetiva entre as gerações, assim como a pequena co-participação das experiências dos mais velhos, provoca nos mais jovens uma ansiedade de realizarem muitas coisas para as quais só teriam condições com mais idade. Por outro lado muitos jovens desejam que os idosos se mantenham no mesmo nível de auto-suficiência de tempos passados. Esta forma de agir dos mais jovens pode ser entendida como meio de defesa contra a percepção antecipada do que lhes poderá ocorrer na velhice.
Tais procedimentos mostram que o velho tem de interagir com um meio cujas exigências são impostas pelos mais jovens; diante disto, a pessoa idosa precisa ter um ego relativamente forte para suportar as tensões advindas das modificações internas e das pressões externas atuais.
Considere-se, a propósito, as palavras de Okuma (1998, p.15-16)
A velhice pode ser vista como uma fase com potencial para o crescimento, à semelhança das demais fases do curso da vida, o que faz com que as fronteiras do envelhecimento sejam modificadas em relação à realidade atual. A visão sobre a velhice vem sendo lentamente mudada. Pode ser um tempo para novas explorações pessoais excitantes, para crescimento psíquico e prazer de viver.
Both (1999) insiste na necessidade de que se estabeleça um diálogo aberto, solidário, sincero, construtivo entre todas as gerações e que seja possibilitado aos “velhos” a oportunidade de, pela comunicação e interação social, criarem uma identidade de cidadãos, de participantes do processo de reconstrução de uma sociedade mais humana. Não há dúvida de que um dos primeiros desafios, nesse sentido, é o próprio “velho” considerar-se e permitir-se ser cidadão.
Marques, Dias e Costa (2010) pontuam que tal idéia pode ser considerada impossível ou até parecer utopia, quando no mundo os ideais predominantes são de uma sociedade cientificamente programada e globalmente integrada pela lógica do capital (MORIN,1989).
Seria improdutivo, portanto, nesta mesma lógica, raciocinar-se em solidariedade, em diálogo, em interação comunicativa, em história de vida, em qualidade para as pessoas de terceira idade. Entretanto são essas preocupações elementares que fazem o sentido da existência e não permite que a vida se torne um acontecer sem sentido (BOTH,1999).
As representações sociais da velhice têm implicações na vida cotidiana, à medida que os comportamentos adotados por um indivíduo ou grupo de indivíduos acometidos da prática desta são resultantes do modo como eles representam socialmente essa prática e do significado pessoal que esta adquire em suas vidas (ARAUJO; CARVALHO, 2005).
O estudo das representações sociais da velhice tem a possibilidade de contribuir para que melhor se compreendam as representações dos significados com que os indivíduos se relacionam com uma velhice bem-sucedida.
Conclusão
Os vínculos intergeracionais, num processo de construção e desconstrução, caracterizam um espaço relacional privilegiado no grupo familiar. A família é um laboratório dinâmico onde convivem e interagem a autonomia individual e as variáveis sociais capazes de conduzir a novas formas de leitura do mundo contemporâneo, melhores e mais competentes, quando estimuladas adequadamente (RUSCHEL e CASTRO, 1998).
Na família ocorre a estruturação da dinâmica “status” e papel. MORAGAS (1997) propõe os conceitos de família de procriação e de orientação. Família de orientação é aquela em que se nasce. Quando os filhos casam, dão origem à própria família de procriação, cujos laços são mais consistentes, pois nela ocorre a maior parte da experiência familiar. A dinâmica vital, estabelecendo esta dupla natureza da família, determina uma complexidade na interação dos diferentes papeis familiares, que são construídos, flexíveis e negociados entre as pessoas indicadas (RUSCHEL e CASTRO, 1998). Ao mesmo tempo, vislumbra-se que os papeis familiares não se realizam, hoje, sem conflitos de poder ou de autoridade ou de uma confusão entre os dois conceitos.
As relações intergeracionais são desiguais devido aos diferentes papeis sociais. A característica assimétrica das relações, como posto por RUSCHEL E CASTRO( 1998), efetivas na complexidade social, desestabilizam em muitos momentos e aspectos, as relações de poder, desenvolvendo conflitos que alguns autores catalogam com conflitos de gerações. “Nas relações avós/netos está ocorrendo um fato novo que é um número menor de netos potenciais para entrar em relação com um número crescente de avós: antes muitos avós, de idade avançada e saúde precária; hoje a quantidade de avós, cada vez mais jovens, proporciona maior contexto relacional” ( MORAGAS, 1997, p.131).
O idoso do presente coloca-se como sujeito de experiências pessoais, e procura, assim voltando-se para si mesmo, num trabalho de introversão, alcançar a compreensão de seu papel na modernidade social. Ressignificando, ele próprio, as condições de existência no seu tempo e na sua cultura e criando, a cada momento, um novo capítulo de sua história pessoal. É um apelo interior que o idoso vivencia e interpreta na crise de seu tempo e de seu espaço que ele quer compartilhar, nesta era de mudanças.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, L. F.; CARVALHO, V. A. M. L. E. Aspectos sócio-históricos e psicológicos da velhice. Mneme - Revista de Humanidades, UFRN, v. 06, n. dez-jan, p. 01-12, 2005
D’ ANDREA, F. F. Desenvolvimento da personalidade: enfoque psicodinâmico. Rio de Janeiro, 12ª edição, Bertrand Brasil, 1996.
DATASUS 2009. População de idosos no Brasil. Disponível em: http://www.datasus.gov.br. Acesso 15 ago. 2011.
MORAGAS, R. Gerontologia Social. São Paulo, Paulinas, 1997.
MORIN, Edgar. Idéias contemporâneas. São Paulo: Ática, 1989.
______. Rumo ao abismo? Ensaio sobre o destino da humanidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Ltda, 2011.
RUSCHEL, A. E. CASTRO, O.P. O vínculo intergeracional: o velho, o jovem e o poder. In Psicologia: reflexão e crítica vol.11 noº3 Porto Alegre, 1998. http//:www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex&pid=50.
http://escoladepais.org.br/index.php/artigo/168-a-velhice-como-representacao-social-nas-familias-contemporaneas
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