terça-feira, 18 de junho de 2019

Estudo Linguistico dos Memes


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O gênero multimodal meme 
A existência de textos multimodais nos leva a questionar se há gêneros textuais multimodais e como eles se organizam. Tendo em vista que gêneros textuais são “textos materializados em situações comunicativas recorrentes”, ou seja, relacionados a interações sociais, tendo funções específicas nas diversas esferas do nosso cotidiano (MARCUSCHI, 2008, p. 155), Kress (2003) chega à conclusão de que é possível termos gêneros multimodais.
Entretanto, temos que ainda estruturar teorias e organizações seguindo esta premissa, pois as estruturas e classificações que temos hoje são em sua maioria referentes a aspectos linguísticos. No presente estudo iremos dar maior atenção a um gênero textual multimodal muito comum na vida de nossos alunos e que por isso merece maior reflexão: os memes da internet.
Os memes sempre fizeram parte da cultura humana, contudo, o conceito de meme ganhou força nos últimos anos graças ao surgimento da internet. Hoje, quando pensamos na palavra meme, vêm em nossa mente variados exemplos de postagens engraçadas que vimos no Facebook, Tumblr, Twitter, Instagram e em outras redes sociais do nosso cotidiano. Sem falar na presença desses mesmos memes em propagandas, palestras, e quem sabe até mesmo na escola. Entretanto, o termo é mais antigo do que a própria internet, aparecendo pela primeira vez em 1976, no livro do biólogo Richard Dawkins, O Gene Egoísta. Segundo Dawkins (2006), a transmissão cultural é análoga à transmissão genética, pois sua evolução se dá também pela imitação. Desta forma, o autor deu o nome de meme à unidade de replicação da cultura, lembrando a palavra grega para imitação, “mimeme”, ao mesmo tempo sendo um monossílabo que rimasse com gene, unidade da hereditariedade. 26 Meme seria tudo aquilo que se multiplica na cultura por meio de uma cópia. Alguns exemplos de memes, de acordo com Dawkins, seriam músicas, ideias, frases de efeito, roupas, modas e outros aspectos culturais. O autor afirma que os memes se propagam passando de cérebro a cérebro por um processo de imitação quase que viral, competindo entre si por nossa atenção e por espaço em nossa memória, assim como, nas tecnologias às quais eles se veiculam. Isto é, existem memes que fazem mais sucesso que outros e essa seria a seleção natural dos memes. As três características principais de um meme de sucesso na teoria de Dawkins (2006) são a fidelidade, a fecundidade e a longevidade. Para que um meme tenha sucesso, ele deve ter a capacidade de ser copiado sem muitas mudanças, saindo relativamente intacto (fidelidade). Além disso, ele deve ser capaz de ser copiado rapidamente, influenciando o maior número de pessoas em pouco tempo (fecundidade), assim como deve ser capaz de ficar em evidência para novas cópias pelo maior tempo possível (longevidade).
Há muitas críticas à teoria de Dawkins, principalmente devido ao fato de o sujeito envolvido nesse processo de replicação ser descrito pelo autor como um sujeito passivo (LANKSHEAR; KNOBEL, 2006; SOUZA, 2014; HORTA, 2015). Segundo Lankshear e Knobel (2006), Dawkins tem a tendência de dar muita autonomia aos memes, pois o autor menciona que nós, humanos, somos somente máquinas de transmissão dos memes e que nós devemos nos adaptar a eles, não o contrário. Já os memes que conhecemos, os memes da internet4 , surgiram com o crescimento das tecnologias de edição e criação de imagens. Horta (2015) define os memes da internet como práticas da internet, ideias, brincadeiras, piadas que se espalham de maneira viral, repetindo um modelo formal básico. São grande parte de baixa qualidade e com aspecto grosseiro por serem feitos em sua maioria por amadores (HORTA, 2015) e retratam a vida das pessoas e suas dificuldades, acrescentando um tom irônico e até satírico (MORAES, 2013).
Geralmente os memes da internet são postados em diferentes redes sociais e utilizam-se de diferentes formas de expressão - imagem, foto-legendas, vídeo, tirinhas, gif, hashtags, dentre outras - o que os torna um gênero textual multimodal. Para Knobel e Lankshear (2007), os memes online são outros tipos de memes e, no lugar da fidelidade, uma das suas características principais seria a replicabilidade, pois, no final das contas, o meme não permanece intacto quando distribuído, querendo ou não ele é modificado de alguma maneira. Contudo, a mutação não precisa ser um fator ruim já que auxilia na fecundidade do meme. Cada ocorrência memética, assim, torna-se uma releitura do meme de origem (HORTA, 2015).
Ao falar dessa mutação dos memes, Knobel e Lankshear (2007) acrescentam outras três características aos memes da internet: a justaposição, a intertextualidade e o humor. Em muitos memes da internet verificamos a utilização de acoplamentos de imagens justapostas, sendo resultados de bricolagens e remixagens realizadas pelos usuários ao modificarem um meme já existente. Remixes são organizações e adaptações de algo já existente, geralmente focando na criação de uma versão alterada e com novos sentidos de um trabalho (BUZATO et al., 2013; LAMB, 2017). Muitas dessas remixagens acontecem de maneira a relacionar outros textos e ideias, o que nos remete à segunda característica apontada por Knobel e Lankshear (2007), a intertextualidade, a qual ocorre em um meme quando este faz referência a eventos, artefatos e práticas da cultura popular. Por sua vez, o humor tornou-se mais livre com as novas tecnologias, pois o usuário é capaz de buscar o que o faz rir e transmitir esse conteúdo aos amigos, proliferando o riso. Entretanto, o próximo interlocutor deve conhecer o assunto tratado no meme para entender, ou seja, para ocorrer o riso é necessária uma identificação por parte do leitor (MORAES, 2013).
Nos memes o humor é abordado através de ideias absurdas que dão maior atenção a coisas banais do cotidiano ou através de algum comentário satírico de crítica social (KNOBEL; LANKSHEAR, 2007). Já para Horta (2015), o meme seria a regularidade, sendo as duas únicas regras a paródia e a repetição. A paródia seria a natureza intertextual do meme, pois apropriamos algo seguido de uma recriação. Já a repetição de um meme seria a réplica de uma leitura possível do meme original. Por sua vez, há dois tipos de repetição, segundo a autora: pela forma e pelo conteúdo. Lankshear e Knobel (2007) lembram que, assim como outros gêneros textuais, o meme faz parte de eventos interacionais muito maiores que a leitura e a escrita, pertencendo a uma prática de letramento a qual envolve as pessoas decidindo como escolherão interpretar um meme e como irão passá-lo aos outros, assim como o contexto em que ele está inserido, as experiências e valores relacionados. Horta (2015) corrobora ao dizer que existe uma comunidade linguística interpretativa do meme e que esse não pode ser entendido fora do seu momento histórico e da sua comunidade. Como afirmam Lankshear e Knobel (2007), olhar para um meme de maneira que ele faça sentido por ele mesmo é deixar de lado o que é mais importante nele: o seu contexto.
Por isso a relevância em se trabalhar com novos letramentos e, consequentemente, com novos gêneros textuais multimodais em sala de aula, no caso dessa proposta, o meme. O objetivo não seria somente agregar os alunos a essas comunidades de prática, visto que muitos já estão inseridos, mas sim fazer com que eles reflitam e identifiquem, por exemplo, quais memes os influenciam, avaliando os seus efeitos (LANKSHEAR; KNOBEL, 2006). Logo, nós, professores, somos responsáveis pela formação de consumidores e produtores críticos de memes.
 REFERENCIAS:

BUZATO, M. E. K.; SILVA, D. P. da; COSER, D. S.; BARROS, N. N. de; SACHS, R. S. Remix, mashup, paródia e companhia: por uma taxonomia multidimensional da transtextualidade na cultura digital. RBLA, Belo Horizonte, v. 13, n. 4, p. 1191-1221, 2013.

DAWKINS, R. Memes: The New Replicators. In: _____. The Selfish Gene. 30th anniversary edition. New York: Oxford University Press, 2006, p. 189-201.

HORTA, N. B. O meme como linguagem na internet: uma perspectiva semiótica. 2015. 191 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação) - Faculdade de Comunicação, Universidade de Brasília, Brasília, 2015.

KNOBEL, M. Memes, L/Literacy and Classroom Learning. In:_____ New Literacies: Everyday Practices and Classroom Learning. Second Edition. New York: Open University Press, 2006, p. 210-244. LANTOLF, J. P. The Sociocultural Approach to Second Language Acquisition: Sociocultural theory, second language acquisition and artificial L2 development. In: ATKINSON, D. Alternative Approaches to Second Language Acquisition. Nova York: Routledge, 2011, p. 24-47. 

KNOBEL, M.; LANKSHEAR, C. Online Memes, Affinities and Cultural Production. In: __ (Org.). A New Literacies Sampler. Peter Lang, 2007, p.199-227. LANKSHEAR, C.; KNOBEL, M.. From ‘reading’ to ‘new’ literacies. In: ___ New Literacies: Everyday Practices and Classroom Learning. New York: Open University Press, 2006, p. 3 - 31. 

LANKSHEAR, C.; KNOBEL, M.. Sample ‘the new’ in New Literacies. In: ___ (Org.). A New Literacies Sampler. New York: Peter Lang Publishing, 2007, vol. 29, p. 1-24. 

LANKSHEAR, C.; LIMA, M. dos S. L.; COSTA, P. da S. C. O diálogo colaborativo como ação potencial para a aprendizagem de línguas. Trab. Ling. Aplic., Campinas, v. 49, n. 1, p. 167-184, jan/jun 2010.  

LÉVY, Pierre.  A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. 5. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007, 212 p. LEWIS, C.. New Literacies. In: LANKSHEAR, C.; KNOBEL, M. (Org.). A New Literacies Sampler. New York: Peter Lang Publishing, 2007, vol. 29, p. 229-238.

KRESS, G. Literacy in the New Media Age. New York, USA: Routledge, 2003, 186 p. LAMB, B. Dr. Mashup or, why educators should learn to stop worrying and love the remix. EDUCAUSE review, p. 13-24, July-August/2007.

MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008, 296 p. 

MORAES, P. B. O compartilhamento de conteúdo a partir de fan pages de memes de humor no Facebook: uma análise das postagens do 9GAG, 9GAG Brazil e Site dos Menes. 2013. 72 f. Porto Alegre. Trabalho de conclusão de curso (Comunicação Social) - Faculdade de 58 Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2013.

SOUZA, H. da C. A. de. Memes (?) do Facebook: reflexões sobre esse fenômeno de comunicação da cultura ciber. Temática, João Pessoa, NAMID/UFPB, ano X, n. 07, p. 156- 174, jul/2014.


https://lume.ufrgs.br/handle/10183/178865

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