segunda-feira, 13 de abril de 2020

A inclusão do Menor Infrator



Ser adolescente é ter o direito de ser tratado de maneira igual, sem distinção de qualquer natureza, respeitando o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à sua própria historia, demonstrando em uma sociedade democrática a aceitação de toda adversidade existente, no caso adolescente em conflito com a lei. Em pleno século XXI, perpetua-se ainda o descaso com a Infância e Juventude, especialmente com os adolescentes infratores, pois eles não são encarados como prioridade na pauta governamental.
A sociedade continua solicitando medidas de repressão e se omitindo na luta pela melhoria da qualidade do atendimento a estes jovens. Enquanto isso, as instituições criadas para ressocializar, constituem-se em uma etapa de estigmatização desses adolescentes. A maior prova do fracasso do Estado é o destino das jovens ao final das medidas socioeducativas ou em cumprimento, posto na rua da mesma maneira que entraram desamparados e muitas vezes sem chances reais de inclusão na sociedade. Continuam sendo olhados como um perigo a população.
Passado vinte anos da promulgação do ECA, a sociedade precisa ainda se esforçar muito para que ele saia do papel e seja consolidado na prática, essa é uma preocupação muito maior do que a discussão sobre a diminuição da idade penal. Consagrada a Doutrina da Proteção Integral, passou-se a vislumbrar que fosse dada primazia ou preferência a suas causas em qualquer política social pública voltada a criança e adolescente, atribuindo o dever de proteção de todos os seus direitos não somente ao Estado, mas também à família e à sociedade.
Seguindo o que prescreveu o texto constitucional, o ECA ratificou a condição das crianças e dos adolescentes enquanto sujeitos de direitos, e regulamentou a ‘prioridade absoluta’ prevista na CF. O ECA, por outro lado, além de positivar ordinariamente direitos materiais da infância e juventude, estabeleceu novas formas de buscar-se a eficácia dos mesmos não só por meio da previsão de procedimentos processuais para a defesa desses direitos, como também através das novas formas de articulação por meio do Sistema de Garantia de Direitos, que propôs entre o Estado e a sociedade num sistema amplo de viabilização, atendimento e garantia de direitos, sustentado em três eixos fundamentais: o de proteção integral da criança e do adolescente; o de vigilância, que se relaciona ao cumprimento do que o próprio ECA prevê, e o de responsabilização pelo não atendimento, atendimento irregular ou violação de direitos individuais ou coletivos.
O ECA ao longo de seus anos de existência tem suscitado muitas reflexões em torno da realidade de crianças e adolescentes, da Doutrina de Proteção Integral e dos programas e políticas sociais que se propõem à aplicação do mesmo. Coincidindo com esse mesmo período, vem registrando um crescente e preocupante número de casos de adolescentes participando de infrações graves, algumas vezes praticadas contra vítimas também adolescentes, transformando-os simultaneamente em autores e vítimas da violência social. Tais dados ocupam lugar de destaque na mídia, que parece fortalecer a construção de um fenômeno no contexto da violência urbana, cujos protagonistas – autores e vítimas – situam-se justamente como objeto fim da Doutrina de Proteção Integral.
Os diversos processos de representação e exclusão social têm conferido grande força e periculosidade a jovens, sobretudo os pobres, do sexo masculino, vinculando-os as identidades ‘delinquentes’, favorecendo o surgimento de uma categoria de ‘pequenos bandidos e vilões’, ao invés de focalizar a fragilidade social sob a qual tais sujeitos se encontram. 
A necessidade de incluir socialmente o adolescente em conflito com a lei na rede é uma ação a ser desenvolvida com urgência para que esses jovens em fase de desenvolvimento passem por um processo de intervenção social, pois ninguém nasce ‘infrator’, enquanto nenhuma medida for tomada estaremos garantindo a existência dos futuros frequentadores dos sistemas prisionais. É dever da família da sociedade e do estado garantir o pleno apoio ao desenvolvimento da criança e do adolescente conforme prevê a CF. Ações isoladas, de pessoas, de organizações não governamentais, de associações comunitárias, de secretarias públicas, serão sempre ações paliativas. É fundamental tomar o tema da inclusão social do adolescente em conflito com à lei como de interesse publico prioritário, que deve ter medidas urgentes executadas de modo a garantir o pleno desenvolvimento de todas as camadas da sociedade. As políticas públicas devem ser retiradas do papel e colocadas em prática. É necessário descruzar os braços e implementar uma cultura de ação no sentido de Inclusão social dos adolescentes infratores.
As ações dos atores da medida sócioeducativas precisam ser reestruturadas, precisamos trabalhar a família, capacitar e dar condições aos profissionais da rede de proteção que atuam na área, inserir a comunidade e a sociedade como um todo nesse processo de forma permanente. Infelizmente ainda há uma ausência de programas governamentais permanentes e eficazes voltados a esse público que vêm passando por um processo constante de exclusão, estando sempre à margem da sociedade e das práticas de cidadania, limitando-se ao mínimo de condições estruturais e pequenas medidas de auxílio governamentais, mantendo uma cultura assistencial.
Ouvir, conhecer e reconhecer o adolescente como uma categoria social marcada por inúmeras especificidades é um enorme passo para a formulação de políticas públicas de caráter universalizante, que atenda a jovem das classes populares, que vivem à margem da sociedade e presenciam um alto nível de exclusão social por meio da baixa escolaridade; altos índices de 100 desemprego e violência; ausência e/ou ineficácia dos aparatos estatais como creches, postos de saúde, escolas, áreas de estímulo à cultura, etc. Os governos, não perceberam a necessidade de desenvolver ações voltadas aos adolescentes, principalmente quando estes são de regiões periféricas que já sofrem sistematicamente em seu cotidiano, a falta da ação governamental. Para completar este quadro de falta de um olhar aos adolescentes, devem-se destacar as escolas, que possuem uma característica elitista com uma estrutura curricular muitas estratificada, quase sempre com ausência de ações voltadas ao atendimento das demandas do jovem infrator. Refletir sobre o conflito em um olhar pedagógico implica em situa-lo num determinado contexto histórico, cultural e institucional.
Desta forma a escola e uma instituição onde se processa mediações e conflitos. Isto implica de como nós educadores refletimos e agimos na gestão de tais conflitos. Neste contexto as escolas muitas vezes não preparam os jovens para uma discussão sobre sexualidade, drogas, artes, espiritualidade respeitando todas as religiões, segurança e liberdade de expressão, antes colaboram muitas vezes com a reprodução da exclusão.
Penso como Espírito Santo (2014) que a escola se constitui no melhor lugar para esta discussão. Muitos jovens percebem também que o modelo de escola atual dificilmente vai promover mudanças nas suas vidas. O desemprego para o jovem é bastante grande. O jovem já se encontra desestimulado, já que muitos são oriundos de camadas populares, em que há baixo nível de escolaridade e as questões de etnia e gênero estão incluídas. É preciso entender que a educação é verdadeiro investimento, não é despesa, pelo contrário, o investimento em educação, reduz gastos com outros serviços públicos inclusive, na prevenção na entrada desses jovens nas instituições de medida socioeducativa, como a Fundação CASA. Sendo assim o Programa Escola que Protege, surge com o propósito de dar conta, a partir do cotidiano escolar das dúvidas, e das múltiplas formas de 101 violência dentro do espaço escolar e da sociedade, criando uma nova forma de diálogo com as áreas trabalhando a formação da comunidade educativa.
Desse modo, considera-se que o conjunto de desigualdades inerentes à sociedade também se exprime na participação dos jovens na vida politica, que não escapa do crivo das diferenças de classes. Uma fração dessa juventude reage e vem se colocando na cena política, buscando seu espaço de participação no movimento estudantil. O papel desempenhado pelo Estado, no que tange às políticas públicas para juventude, demonstra insuficiência quanto a uma legislação especifica para esta categoria social. As políticas públicas deveriam em primeira instância identificar as demandas das várias juventudes, culminando numa legislação que garantisse ao jovem uma política de direito. Esta preocupação leva a refletir as práticas educativas em que Freire (2003, p.96) vem discutir que “não há prática educativa”, como de resto nenhuma prática, que escape a limites ideológicos, epistemológicos, políticos, econômicos, culturais, não negando a importância da educação e descartando a solução mágica para os problemas sociais. Encontra-se frequentemente a referência ao adolescente em conflito com a lei, dentre outras, como: ‘ele é culpado’, ‘não quer ser recuperado’, ‘isso é perda de tempo e dinheiro’, ‘ele é mal’, ‘a família dele não liga’, ‘não tem jeito’, ‘não tem futuro’. Sendo assim os governos muitas vezes representados na rede de proteção por suas equipes como psicólogos, pedagogos, assistentes socais, e demais técnicos, precisam compreender que a relevância social do atendimento a esses jovens consiste em perceber que são pessoas com direitos e em 15 Art. 32 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 para incluir conteúdo que trate dos direitos das crianças e dos adolescentes no currículo do ensino fundamental. O projeto Escola que Protege é voltado para a promoção e a defesa dos direitos de crianças e adolescentes, além do enfrentamento e prevenção das violências no contexto escolar.
A principal estratégia da ação é o financiamento de projetos de formação continuada de profissionais da educação da rede pública de educação básica, além da produção de materiais didáticos e paradidáticos nos temas do projeto. 102 desenvolvimento e que, como todos os cidadãos, devem ter acesso à saúde, educação, cultura, lazer, esporte, profissionalização. Ao finalizar esta pesquisa pude entender a grande importância que o trabalho da rede de proteção e a intersetorialidade exercem para o sucesso de uma gestão pública. Atender crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade exige um fluxo que vai orientar as ações e encaminhamentos sendo necessário para isso o conhecimento aprofundado dos órgãos e serviços que atuam diretamente com este segmento da população. As iniciativas da rede são limitadas e, às vezes, inviabilizadas por conta da carência de recursos materiais e infraestrutura dos serviços.
Vários são os problemas são apresentados pelos profissionais, entre os quais: a falta de espaço físico adequado, a falta de material educativo, falta de profissionais, etc. A intersetorialidade defendida como política de governo local é prejudicada pela ausência de um planejamento articulado que consiga envolver todos os atores da rede de proteção importantes como a escola. Essa política reflete uma nova linha de reflexão da atenção ao do adolescente, principalmente por evidenciar a integralidade da atenção em consonância com um dos princípios do ECA, o que pressupõe o atendimento integral com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais, destacando a importância da escola e a necessidade de estabelecer processos de trabalho intersetoriais e interdisciplinares. Como forma de operacionalização do SGD, a rede de atendimento e atenção a crianças e adolescentes é composta pelos diversos atores e instituições que possuem a responsabilidade de executar a política de atendimento dos direitos da infância e adolescência.
É neste sentido que cada órgão ao representar um setor, deve atuar com comprometimento exercendo suas atribuições de maneira resolutiva sem, portanto, perder a noção de articulação das ações de defesa, promoção e controle dos direitos das crianças e adolescentes. A interdependência das 103 ações neste contexto é de suma importância, pois mesmo cumprindo seu papel as instituições dependem uma da outra para que haja um atendimento integral, não fragmentando assim o processo de atenção e cuidado. Neste sentido a prática interdisciplinar redesenha o espaço da rede para além dos ‘muros’ transformando-o em um espaço vivo de interações. Quanto à gestão, o sistema de garantia funda-se nos princípios da descentralização político-administrativa e da participação social na execução das ações governamentais e não-governamentais de atenção à população infanto-juvenil.
Neste sentido, é necessária uma construção de articulação para o fortalecimento do SGD, em prol da criança e do adolescente. Porém o desafio maior, e romper a fragmentação do trabalho, isto requer um uma nova forma de olhar e vontade politica em todas as esferas governamentais. É preciso ter em mente ainda que as interações entre os componentes do sistema se dão caso a caso, conforme a especificidade dos diferentes contextos em que se atua para garantir os direitos de crianças e adolescentes.
Neste sentido, a prática do sistema ganha concretude por meio das redes de proteção integral que se conformam localmente para promover o atendimento às necessidades de crianças e adolescentes. Portanto a noção de rede permite traduzir com mais propriedade a trama de conexões inter organizacionais em que se baseia o sistema de garantia dos direitos de crianças e adolescentes, pois compreende o complexo de relações acionadas, em diferentes momentos, pelos agentes de cada organização para garantir esses direitos. As redes de proteção integral são, portanto, o aspecto dinâmico do sistema, conformado a partir das conexões entre atores que compartilham um sentido de ação. 

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